Luana Santahelena

Manual de SobrevivĂȘncia para Quem Marca a Felicidade na Agenda

Eu sempre fui dessas

que planejava a vida para dali a cinco anos —

como quem guarda uma taça de cristal

para brindar só quando virar adulta (se é que um dia isso chega).

“2028: Apreciar o presente.”

Escrevi assim, toda cheia de expectativas

e uma caneta dramática demais para o meu próprio bem.

 

Hoje rio — meio tímida, meio cúmplice —

do absurdo que é marcar no calendário

o dia exato em que vou me sentir viva.

É como comprar ingresso para um show

e ficar ali, na porta,

lendo a biografia do artista

enquanto a música já vibra no chão.

Ah, a ironia gentil do universo,

sempre disposto a me dar um tapinha no ombro

e sussurrar: “Menina, entra logo.”

 

A vida chega assim, sem avisar,

tipo visita que aparece na hora errada

e me encontra de pijama, descabelada,

com a geladeira servindo mais ecos que alimentos.

E ainda assim, ela sorri —

como quem diz que não liga para etiqueta

e aceita até café solúvel em copo de requeijão.

 

O passado, esse professor de humor duvidoso,

me ensinou com pequenas quedas

que a única coisa que se ganha com idealização

é dor nas costas de tanto carregar expectativa.

E eu, que já tentei alinhar a alma

com régua e prumo,

agora me vejo dançando com o próprio caos,

do jeitinho torto que ele pede.

 

Então repito — para mim mesma,

para o futuro que insiste em se adiantar,

e para o relógio que vive me julgando:

relaxa, menina,

aproveita o caos.

Ele também sabe cuidar de você

quando você para de tentar controlá-lo.

 

E, no fim, percebo sorrindo

que talvez o presente seja isso:

um pequeno improviso,

uma bagunça acolhedora,

um palco onde ninguém ensaiou —

mas todo mundo, de algum jeito,

brilha.