Marujo

Deus X Machina

Primeiro ele devorou a rocha de ciano com seus dentes de prensa hidráulica.
Dúbio, para as vítimas da existência, se estavam diante de uma divindade,
ou de um bêbado doente, que, em um de seus muitos surtos itinerantes,
encontrou um banquete digno, de enjoo, tédio e crueldade equiparáveis.

CLANK. A majestade continua o processo mecânico, a terra encontrando o metal.
CLANK. As vítimas jogam os frutos de sua existência contra a máquina Deus.
CLANK. Os frutos podres não caíram longe da árvore genealógica anciã.
CLANK. Pedras e bombas atômicas não são mais que uma memória da dor.

Ela vomita, mas o alcance é limitado, englobando apenas o hall de sua hospedagem.
Todos os visitantes são engolfados pelo mais puro alcatrão, dádiva de outras rochas,
com sofredores não muito diferentes, e pecadores igualmente hereditários.
Todos os irmãos novamente reunidos. Todos novamente afogados no breu.

No quarto dia do relógio do renascimento, ele abre a boca e inspira um buraco negro.
Junto, joga com extrema rigorosidade a rocha pra um lado da boca, pro outro.
As vítimas então revivem a existência. Morte, Vida, Dor, Prazer. Realidade e Ficção.
Em coro, vossas conclusões. “Nunca fomos reais, e quem nos pintou errou a mão.”


Ele não engole. O gosto daquele pequeno experimento é limitado e grotesco.

Boas intenções demais transformam o aroma em algo quase doce.
As infortunas consequências de se sonhar tornaram o sabor amargo e culpado.
Juntos, um paradoxo repugnante, julgado como essencialmente viral.


Ele o cospe pra frente, ele cospe com a malevolência de algo que nunca amou.

Somente julgou aquilo que lhe sucede como digno, indigno, e nunca suficiente.
Nasce então uma nova rocha, de cor igualmente ciana, e de forma igualmente oval,
com mais sofredores e homens que, no hubris, dizem entender a Deus.


No sétimo ele descansa, até chegar a hora de retornar.