Luana Santahelena

A pior saudade

A pior saudade não grita —

sussurra dentro da ossada dos dias,

um eco que não encontra paredes,

porque a casa que a abrigava virou vento.

 

É como tentar abraçar a fumaça

de uma vela que se apagou sozinha,

ou escrever uma carta

para um endereço que o tempo derrubou.

 

Há saudades que esperam retorno;

esta não.

Ela se alimenta do próprio vazio,

rumina lembranças até o pó

e se deita, faminta, no colo do nunca mais.

 

Recordar é tocar um retrato

que já não reconhece o rosto:

a cor fugiu, o olhar se desfez,

mas a moldura insiste em doer.

 

O coração, esse arqueólogo teimoso,

escava ruínas que o amor deixou,

procura vestígios de uma voz

que o silêncio guardou.

 

Ah, se ao menos houvesse corpo,

ou sombra, ou qualquer sopro de “ainda”!

Mas resta só o nada vestido de memória,

um perfume sem flor,

um nome que já não responde.

 

A pior saudade é essa:

a que sobrevive ao motivo.

Um luto que esqueceu o morto,

um fogo que queima sem lenha,

um amor que persiste —

feito eco, dentro do tempo que ficou.