Eu me lembro da criança que eu era.
Eu me sentia completamente diferente das outras,
sabia que havia algo em mim que não havia nas outras crianças,
e isso me perturbou durante muitos anos,
e me perturba até hoje.
Todas aquelas coisas que eu não entendia
sempre me tirando a paz,
a paz que eu nunca tive.
De fato, eu me livrei de algumas,
mas ainda há coisas que eu não entendo,
há coisas que ainda tiram a minha paz.
E talvez eu nem tenha me livrado de fato,
mas o fato de ter consciência, de questionar
e entender que não está tudo bem,
talvez seja também uma maneira de se livrar das coisas ruins.
Pode ser o início do fim.
Já me aconteceram muitas coisas boas na minha vida,
já tive motivos pra sorrir, pra ser feliz,
mas parece que nada disso é o suficiente
para que eu possa me livrar das coisas ruins do passado.
É como se os sentimentos ruins fossem mais fortes que os bons,
então me faz sentir que não importa quantas vezes eu tente,
não importa quantas vezes eu olhe pra frente,
sempre irei me sentir como antes.
Eu tento fazer isso,
tento olhar para frente e focar nas coisas boas,
mas a verdade é que eu ainda nem sei por onde começar,
pois ainda há coisas que eu não entendo.
É quando você está em profundos sentimentos,
onde você chora sem parar,
entre dias e noites, meses e anos,
e nada disso parece ter fim.
As lágrimas que escorrem sob o seu rosto secam
e ficam tal como gelo, como lágrimas congeladas,
chegando ao ponto de se criar um palácio à frente de seu rosto.
E agora que seu rosto foi coberto por um palácio de lágrimas congeladas,
você está cego demais para enxergar o mundo lá fora.
Toda a vida que havia diante de seus olhos desapareceu,
e isso me lembra uma pessoa em estado de depressão profunda,
onde nada mais parece fazer sentido,
onde a vida deixa de ser vida e passa a ser prisão.
Agora você está preso em um palácio de lágrimas congeladas.
Apesar de você ir ao psicólogo,
apesar das promessas e das coisas boas da vida,
você sempre irá se sentir como um depressivo,
pois isso infelizmente está em você
e não poderá escapar tão fácil das coisas ruins.
Pois entre as frestas de paredes sussurrantes
de um palácio de lágrimas congeladas,
sentimentos ruins ainda existem.
Então se torna um paradoxo,
você quer olhar a vida lá fora, quer sair da prisão,
mas ao mesmo tempo as frestas que dão vista para a vida
sussurram todas as coisas que nunca fizeram você sentir paz.
Você não vê,
pois está cego pelo palácio de lágrimas que formou em seu rosto,
mas sente com o corpo o vento soprar em sua pele.
Então se lembra da prisão em que está vivendo,
e o brilho que havia em você morre imediatamente.
Todos nós esperamos por ele amanhã,
mas e se ele nunca chegar?
“Por ele amanhã”, ele é o próprio amanhã à espera do amanhã,
à espera do outro dia, de mais um dia.
E talvez finalmente será um dia não ruim?
Se ele chegar, irá derreter o palácio,
e finalmente eu terei motivos
para todas as coisas que irão trazer a minha paz.
Todas as pessoas, todos os amores e todas as promessas,
toda a ideologia de meritocracia que a sociedade nos impõe,
onde dizem que só há uma única maneira de viver a vida,
e tudo é voltado ao sucesso financeiro.
Então todo esse sentimento é culpa minha?
Até que ponto podemos sofrer por algo,
para que esse sentimento não te possua
até o ponto em que você irá se tornar o seu próprio mal?
Um amor irá salvar a sua vida?
Você sempre esperou por isso,
mas talvez não encontre no outro
aquilo que você realmente precisa.