O amor verdadeiro
se revela quando o encanto adormece
e a presença permanece acordada.
Não nasce em altares, mas em cozinhas:
no vapor que sobe da panela,
no avental manchado que abraça,
na mão que interrompe o cansaço para ajudar,
na voz que se recolhe para ouvir.
É fogo de lareira:
não ruge, mas resiste;
não queima, mas aquece,
alimentado pela lenha miúda dos gestos.
É o olhar que perdoa antes do pedido,
o cobertor estendido antes do frio,
a história repetida que se escuta outra vez
porque, às vezes, vale mais a música da voz
do que o sentido das palavras.
Muitos procuram o amor como ao sol do meio-dia.
Mas ele chega como manhã:
nasce manso, acende aos poucos,
e, quando o brilho se vai, continua luz.
Não promete eternidade;
ergue-a, lenta, sobre a rocha da paciência,
como quem assenta tijolos sem alarde,
um por dia,
com as palmas cheias de cal e constância.
É pão repartido,
água partilhada,
silêncio que compreende.
É o divino de avental,
a eternidade vestida de rotina.
Saberás que o encontraste quando, no cansaço,
algo dentro de ti ainda disser: estou aqui —
e a chaleira, fiel, começar a cantar.
Porque o amor verdadeiro não grita “para sempre”:
ele aprende a ficar.
E fica,
até que o tempo, encostado na porta,
desista de ir embora.