Luana Santahelena

O Quarto Que Não Habito

Eu sonhava com paredes cor-de-rosa,

com ursinhos de pelúcia guardando segredos

que só as crianças sabem dizer sem palavras.

Um mural de rostos amados,

distantes como estrelas —

tão perto nos olhos, tão longe nas mãos.

 

E a cama de casal, vazia,

estendida como um convite

que eu mesma recuso aceitar.

 

Porque o melhor lugar do mundo

era feito de talvez,

de um dia, de quando eu crescer.

E crescer, descobri, é aprender

que os sonhos têm endereço,

mas nem sempre têm chave.

 

O tempo passou como quem foge,

levando consigo o rosa das paredes

e deixando o cinza do concreto.

Os ursinhos viraram poeira doce,

memória guardada em caixas

que não ouso abrir.

 

Hoje meu quarto é real.

Ele existe, sim — quatro paredes, um teto, uma porta.

Mas não é o melhor lugar do mundo.

É apenas o lugar onde eu durmo,

onde acordo sozinha,

onde o silêncio é tão grande

que cabe tudo que não aconteceu.

 

E me pergunto, com um sorriso torto:

será que o melhor lugar do mundo

é sempre aquele que não construímos?

 

Ou será que eu, sem perceber,

desenhei um paraíso impossível

só para ter algo bonito a perder?

 

Talvez o quarto perfeito

nunca tenha sido sobre o espaço,

mas sobre quem eu seria dentro dele.

E eu, que mudei tanto,

não caibo mais no sonho de menina.

 

Resta apenas a realidade.

E ela, irônica e gentil,

me ensina que o melhor lugar do mundo

talvez seja este:

onde aprendo a viver

mesmo sem paredes cor-de-rosa.