Sezar Kosta

A CANÇÃO IMPERFEITA DO MEU CORAÇÃO

Quero viver como quem canta sem saber a letra —

sem medo do silêncio entre os versos.

Viver como uma nota solta, errante,

que mesmo fora do tom,

insiste em ser melodia.

 

Não busco afinar a alma aos moldes do mundo,

mas deixá-la rouca de verdade.

Que minha vida seja um refrão torto,

mas que ecoe inteira,

em cada esquina do meu ser.

 

Que eu gaste meus sorrisos onde ninguém os espera —

em ruas que não têm nome,

em cafés onde o tempo se esquece.

Que eu abrace o acaso como quem dança de olhos fechados,

e tropece nos dias sem vergonha do riso.

 

Cantar desafinado nas calçadas da rotina,

onde o asfalto engole os sonhos pequenos

e o trânsito atropela os segundos.

Mas ali, mesmo ali,

eu componho minha sorte em passos desajeitados.

 

Nem sempre a vida afina:

há notas agudas demais,

pausas que doem como ausência,

e compassos que se arrastam como saudade.

 

Mas é no desalinho que mora o encanto —

amar é errar o tempo,

sofrer é sentir a letra escrita à faca,

e ainda assim,

repetir o refrão de olhos fechados.

 

Ser feliz, talvez,

seja reconhecer a beleza da nota quebrada,

o som que rasga, mas também cura.

 

Que minha vida não seja perfeita,

mas que tenha ritmo —

e que cada tropeço soe como poesia em dissonância.

 

Quero viver essa canção,

mesmo que desafinada,

com a alma exposta como partitura no vento.

Pois mais vale uma verdade imperfeita

do que um silêncio afinado demais.

 

No fim, que digam de mim:

“Ele viveu como se fosse música —

não porque acertou o tom,

mas porque cantou com o coração rasgado,

e nunca calou sua voz.”