biancalessa_

Herança de um encontro breve

Minha filha acaba de adormecer nos meus braços.
O peito dela sobe e desce em uma respiração profunda.
Estranho como um som tão banal pode se transformar em companhia numa noite vazia.

Mais cedo, ao organizar o armário, encontrei um moletom dobrado.
Como pode um pedaço de tecido guardar tantas histórias?
Bastou tocá-lo e fui transportada para uma noite fria — criança no colo, bolsa no braço, receita médica na mão.
Incertezas pairavam no ar, dançando de mãos dadas com a solidão.

E, em meio a passos acelerados, respiração ofegante e coração apertado, um encontro inesperado — mas tão desejado.
“Não achei que você viria.”
“Eu não te deixaria sozinha. Pega meu moletom, está frio.”

Nesse instante, somente nesse breve instante, as dúvidas recuaram,
a solidão adormeceu
e a esperança me abraçou.
Abraço caloroso.
Protetor.

Gargalhadas contagiantes preencheram aquela noite.
Pela primeira vez, senti a completude.
Minha pequena companheira também.
Essa mesma que agora repousa serena nos meus braços.

Pergunto-me se ela sonha com aquele momento,
se sente falta como eu sinto.

Abracei mais um pouco o moletom —
herança de um encontro tão breve quanto luminoso.
Agradeci baixinho e o devolvi ao armário,
do mesmo modo como, aos poucos, tento me devolver ao meu próprio coração.