Sezar Kosta

RECEITA DE NÓS DOIS

Acordei com fome de nós, 

de um prato que não se encontra em cardápio, 

feito à mão, com o sal da saudade 

e o fogo brando do tempo.

 

Misturei duas xícaras de confiança, 

peneiradas com cuidado, sem grumos de dúvida. 

Adicionei paciência — colher generosa, 

daquela que não azeda com os dias.

 

Cortei o afeto em cubos pequenos, 

para render em cada gesto, 

e joguei um punhado de risos 

como quem tempera a alma com leveza.

 

Três pitadas de silêncio confortável, 

onde o amor repousa sem pressa. 

Olhares a gosto — 

porque há sabores que só os olhos revelam.

 

Deixei cozinhar em fogo baixo, 

pois o amor cru fere, 

e o apressado não sente o perfume 

que só o tempo revela.

 

Cuidado com o ciúme — não deixe ferver. 

Ele amarga até o mais doce dos beijos. 

E não mexa demais nas inseguranças: 

elas talham o carinho como leite esquecido.

 

Decorei com planos entrelaçados, 

sonhos servidos em louça de esperança. 

E se sobrar, guarde em potes de memória: 

conservam melhor que qualquer geladeira.

 

Minha amada, 

se um dia duvidar do sabor que temos, 

lembre-se: não há receita infalível, 

mas há mãos que sabem cozinhar juntas.

 

E as nossas, mesmo entre tropeços e improvisos, 

sempre voltam ao fogão do afeto, 

onde o amor é prato principal 

e o tempero — eternamente nosso.