Wander Motta

o pulso da terra

 

a terra pulsa

   devagar
   profundo
   dentro

 não faz barulho
 não grita
 não chama

 é sopro
 é sombra
 é som sem som

 a cada
  vinte e seis segundos
 algo vibra

 um músculo
 no escuro
 bate

   bate
     bate

 no peito do universo
 sem face
 sem pressa
 sem fim

 lá em cima
 a luz se dobra
 em linhas finas
 e dias que não doem

 lá vivem os grandes
  luminosos
  leves
 sem dúvida
 sem morte
 sem nome

 e tudo é sim
 e tudo é sempre
 e tudo é pão

 aqui embaixo
 nós
  com nome
  com medo
  com perguntas

 rastejamos
 furamos
 nomeamos

 o que é esse pulso?
 por que ele bate?
 por quem?

 mas a terra
 não responde

 só pulsa
 só vive
 só repete

 a cada
  vinte e seis segundos

 um tambor esquecido
 bate

   bate
     bate

 como se deus sonhasse
 com a gente
 sem querer