Ela gritava com os olhos.
Não usava palavras —
só aquele silêncio cortante
que deixava a sala menor.
Naquela noite,
a chuva fazia mais barulho que nós dois.
E ainda assim,
nenhum de nós teve coragem de ir embora.
Ela passou por mim
como quem esbarra em lembrança:
devagar, mas fundo.
Tinha cheiro de casa antiga
e um jeito de quem aprendeu a se proteger
com as próprias cicatrizes.
Eu também não era inteiro.
Tinha falhas na estrutura,
frestas por onde o passado ainda entrava.
Mas algo nela me fazia ficar,
mesmo quando a porta estava escancarada.
Amar não foi flor,
foi árvore com raiz em terra seca.
Foi poda, espera,
e vento demais balançando os galhos.
A gente não falava de futuro,
mas dividia o presente com olhos atentos,
como quem cuida de algo que já quase se perdeu.
Fiquei.
Mesmo quando doeu.
Mesmo quando ela disse que não sabia mais amar.
E no fundo, acho que nem eu sabia.
Mas fiquei.
Hoje, quando ela sorri
sem medo de quebrar,
entendo que amar
foi suportar a tempestade
e ainda assim escolher a varanda.
O nome dela ainda dói,
mas não como ferida —
como rastro de um caminho
que eu escolhi seguir
mesmo com os pés descalços.
Poema Homenagem ao meu amigo Melancolia e aos poetas do Mesclado \"O Amor Provoca a dor Para se Tornar mais Forte?\"
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