Luana Santahelena

Amor é Pizza Fria e Meia Solteira

Era sábado, 23h47,

e a última fatia de pizza piscava pra mim da caixa.

Calabresa, fina, com borda recheada —

o tipo de coisa que separa paixões de relacionamentos sérios.

 

Ele olhou pra mim.

Eu olhei pra ele.

A pizza nos olhou de volta,

sabendo que só um sobreviveria.

 

Mas então ele pegou a faca

(pausa dramática)

e…

dividiu.

Me deu a parte com mais recheio.

Ali, eu quase disse \"te amo\",

mas engasguei com a azeitona.

 

No domingo, perdi a meia esquerda

— a listrada, minha favorita.

Revirei o armário, o cesto, até o fundo da gaveta dos talheres (por quê?).

Nada.

Suspirei tragicamente como quem perdeu uma amiga.

 

Na segunda, lá estava ela:

dobrada sobre o travesseiro,

com um bilhete escrito “Missão cumprida”,

e um smile mal desenhado.

 

Ele nem tocou no assunto.

Nem eu.

Mas soube:

amor não é buquê em data marcada,

é pizza dividida e meia resgatada

com a seriedade de um agente secreto.

 

Já brigamos por controle remoto,

temperatura do chuveiro,

e pela vez de lavar a louça.

Mas nunca por besteira tipo

\"quem ama mais\".

 

Porque amor, pelo menos aqui em casa,

chega com molho nos cantos da boca,

meias fora de lugar,

e esse jeito meio torto,

meio bobo,

mas inteiro certo

de estar junto até quando o Wi-Fi cai.