Sezar Kosta

ONDE O AMOR ERRA E ACERTA

Era fim de tarde quando a chuva,

daquelas que não pedem licença,

começou a cair — fina, insistente,

com cheiro de terra e lembrança.

As nuvens, pesadas, davam ao céu

um tom de promessa mal cumprida.

 

Nós dois, parados sob a marquise

de um café qualquer no centro,

olhávamos os pingos sem pressa,

como quem espera o tempo passar

e ao mesmo tempo, algo mudar.

 

Ela mexia no cabelo úmido,

num gesto que conheci antes de conhecer —

como quem tenta arrumar por fora

o que desmorona por dentro.

Eu, sem saber o que dizer,

só ofereci meu casaco

e um silêncio cúmplice.

 

Não era nosso primeiro desencontro.

Houve outros:

a louça deixada,

o filme pausado no meio,

os desencontros de intenções

em noites mal dormidas.

A soma dos erros, os tropeços —

uma matemática exata demais

pro que a gente sentia.

 

Naquele momento,

não nos abraçamos.

Só dividimos o abrigo

e o cheiro de café quente

que vinha de dentro,

misturado ao frio de agosto

e à saudade do que éramos

sem saber ser.

 

Ali, entendi:

não era sobre resolver tudo,

mas sobre permanecer

mesmo quando nada se encaixava.

 

O amor não nos acerta porque é perfeito —

ele nos acerta porque insiste.

Porque apesar das falhas,

dos dias errados,

das palavras que não dissemos,

ficamos.

 

E talvez isso seja amar:

não fechar a conta.

Mas continuar pagando,

com os bolsos cheios de tentativa.