Há um instante invisível
em que o riso se esconde,
como pássaro que abandona o galho antes do sol nascer.
Nesse instante,
o olhar, que antes colhia milagres nos gestos simples,
fecha-se como flor noturna,
e a vida, ainda plena, pesa silenciosa nos bolsos da alma.
Os pés esquecem o compasso da dança na chuva,
as mãos o gesto de brincar com a água,
o coração o perfume que o vento carrega pelo quintal.
Ainda assim, tudo pulsa:
a maçã cintila na fruteira,
o rastro de luz atravessa a cortina,
uma gargalhada antiga ecoa entre paredes esquecidas.
Basta abaixar-se, ouvir o sussurro das formigas,
provar o calor simples do pão recém-assado,
conversar com as horas como se fossem velhos amigos.
E então se percebe:
a alegria nunca partiu.
Ela habita os olhos que ainda sabem brincar,
o coração que escolhe se abrir
e o tempo que nos convida a redescobrir o milagre do simples.