Por ser tão solitário, minha pequena,
eu sempre acabo em um dilema —
o de ter tanto para ver e perceber,
mas ninguém a quem relatar esse meu dizer.
Foi por isso que te mostrei
quão admirável seria compartilhar as aventuras
que nossos olhos, com zoom, verão com o tempo,
depois de tantas luas.
— É verdade… seria uma aventura e tanto.
Percorreríamos vales, estradas,
viveríamos em escaladas atrás de um lugar imaginável,
rasgaríamos os mares em navios a nosso comando.
Isso tudo é muito excitante.
— Já que tanto sonhas em ver tudo isso,
por que falas abatida,
como se até achasses impossível?
— É que eu não sei se consigo…
Ver dessa maneira me exige tanto, parece tão cansativo.
Olhar com zoom deixa tudo feliz, é magnífico,
mas… e se eu deixar de ver no caminho?
E se me perder e acabar caindo num labirinto,
sem conseguir sair,
percorrendo um lugar solitário e desconhecido,
sem você para me guiar, sem um amigo?
— Calma, calma, querida…
Eu estaria o tempo todo contigo.
Logo agora que encontrei alguém
para compartilhar o magnífico,
achas mesmo que te perderia assim, tão cínico?
Jamais deixaria ocorrer tal possível destino.
Eu, mais do que você, não desejo ficar sozinho.
Não se preocupe:
se deixar de ver com zoom, eu, com toda certeza,
te explico de novo.
Seria um belo prazer,
daquele mesmo jeito, te ver sorrindo,
pois me recordaria o dia em que te conheci.
— Tu achas mesmo que consigo?
— É claro que sim!
Pois, se não achasse,
para que te mostraria essa visão de zoom,
tão rara e poética?
Você é capaz de ir além.
Não desejaria viver tal aventura com mais ninguém,
pois foste feita para ver, pois visão a sua não tem
Acredito que aquele que nos criou
pensou que, para nós, desajeitados,
seria uma recompensa cheia de labor
ver a vida de um modo diferente,
quase delinquente,
nesse mundo preto, branco e quadrado.
Por esse motivo, me prostro à sua majestade.
E a realidade é essa:
se nos perdermos, tenho toda a certeza
de que Ele apontará uma estrada reta —
mesmo que o caminho seja cheio de curvas.
Não se preocupe, minha pequena aventureira:
é só olhar com zoom
e nunca mais serás cega.