Na sexta-feira às 18h03,
meu cérebro bate ponto
e deixa um bilhete:
“Volto segunda, talvez.”
Eu, então,
uma entidade sem CPF,
com batom torto e brilho nos olhos,
ativando o modo “paz interior é coisa de quem dorme cedo”,
me transmuto.
Sou agora uma filósofa de boteco,
musa das filas de banheiro feminino,
consultora sentimental de estranhas bêbadas —
“larga esse traste, amiga,
você merece um psicopata melhor.”
Me cubro de purpurina e impunidade,
danço como se a dignidade tivesse me bloqueado no WhatsApp,
gargalho alto,
como quem desafia o IBGE a me classificar.
Responsabilidade?
Deixei na portaria com o porteiro,
junto com o medo de parecer ridícula.
(Vou buscá-los na segunda, se me lembrar.)
Na balada, sou uma entidade mística:
a que pede tequila como se fosse chá,
a que filosofa sobre ex-namorados como se fossem dinossauros extintos,
e jura que \"esse look aqui tem nome: Renascimento.\"
O banco manda SMS:
“Seu saldo está negativo.”
Eu respondo:
“Quem não está, meu anjo?”
— e peço mais uma rodada no débito emocional.
A madrugada me carrega no colo,
descalça, descabelada,
mas plena,
como quem descobriu que a sanidade é superestimada
e que ninguém nunca escreveu um samba memorável
sobre pagar boletos em dia.
Sábado, me atraso até para existir.
Domingo, reviro selfies como quem tenta montar
um quebra-cabeça feito de versões minhas
que não assinaram contrato com o bom senso.
Mas sorrio.
Ah, como sorrio.
Porque nesse caos performático,
nessa libertação quase poética da lógica,
descubro que às vezes
ser “sem juízo”
é o único juízo possível
pra continuar sendo gente.
E se segunda me encontrar de pantufas,
tomando café com ressaca moral,
que saiba:
sobrevivi a mais um fim de semana
onde fui só minha,
louca, leve e solta —
feito confete em apoteose.
Fim do expediente,
início do espetáculo.