Seu brilho não é inocente; é o reflexo da lâmina oculta sob as mangas de renda. Invejo a perfeição de suas mãos frias — tão hábeis em acariciar meu rosto quanto em apertar o nó da corda que me estrangula lentamente, como um sussurro que se transforma em grito.
Você usa vermelho não porque combine com seus lábios, mas porque disfarça melhor o sangue que escorrerá de meus cantos da boca, um prenúncio do que está por vir. Seus olhos, inchados e pesados, não são de insônia, mas de espera — contando os minutos até que eu feche os meus para sempre, como um ato final em um palco que não me pertence mais.
\"Ama-me? Não me ama?\" Perguntas entre dois golpes, enquanto ensaias com ele o gesto de me virar de costas, como se eu fosse apenas um personagem em sua peça cruel. Já decidiram quem segurará meus pulsos e quem enfiará o joelho em minhas costas, como se a dor fosse um mero detalhe na trama?
O maximalismo de seu vestido contrasta com a simplicidade do buraco que cavaram para mim, um espaço vazio que aguarda meu corpo como um espectador ansioso. Espetáculo! Você sempre soube compor cenas, enquanto eu sou apenas o ator que não lerá as críticas no dia seguinte, pois meu papel se encerrará em um silêncio ensurdecedor.
O sal que arde em minhas feridas é o mesmo com que temperarão o jantar de comemoração, um banquete macabro em honra à minha queda. O champanhe que beberão terá o gosto metálico que escorre de minha garganta, um brinde à traição que se disfarça de amor.
E quando minha porcelana se estilhaçar no chão, vocês recolherão os cacos juntos — um ritual íntimo de mãos manchadas, limpando os vestígios de um amor que ousou existir antes que o triângulo se tornasse um dueto.
Repito esse ato até entender:
a fragilidade nunca foi da boneca,
mas do tolo que acreditou
que a porcelana fosse feita para ser amada,
não quebrada.
E assim, na dança da traição,
meu eco se perderá,
um sussurro entre os cacos,
um lembrete de que, às vezes,
o amor é apenas um pretexto
para a morte que se aproxima.