TainĂ¡ Lopes

Familiar zombeteiro.

 

 

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Sou um rato encantado, um servo infernal,

com bigodes torcidos e riso imoral.

Vejo tudo do alto das telhas quebradas,

os humanos? Um circo de almas penadas!

 

“Socorro, é a peste!”, eles gritam no chão,

mas ontem tavam nus dançando no porão!

Com vinho, pecado, suor e orgia —

depois querem cura em Ave Maria!

 

Correm atrás da bruxa da aldeia,

“Me dá um feitiço!” — com voz que cambaleia.

Mas ontem a chamavam de filha do cão,

hoje querem chá pra salvar o pulmão.

 

O padre benze com as mãos trêmulas,

mas a cruz já tá cheia de pústulas.

E eu, do telhado, quase me engasgo

de tanto rir do teatro macabro!

 

“Coma alho! Queime sálvia! Pendure um sapo!”

Enquanto o defunto já fede no saco.

Passam perfume, fecham as janelas,

mas esquecem que a peste mora entre elas.

 

Tem quem beije o chão, quem lamba madeira,

quem passe a bunda na água da ribeira.

E ainda diz: “Foi Deus que mandou!”

Não, querido... fui eu quem soprou!

 

E a bruxa só observa, calada e serena,

costurando bonecos, bordando a cena.

Enquanto eu, seu fiel, rolo de rir

com esses humanos tentando fingir...

 

Que controlam a vida, o amor, a doença —

mas vivem na beira da própria sentença!

Então, enquanto eles gritam por salvação,

eu danço nos ossos com satisfação.