Versos Discretos

Liturgia da Entrega

Dominas o dia com cetro nos lábios, sentença nos olhos —
mas quando a noite cai, és verbo em minha língua, despojo.
Te beijo os ombros como quem lê uma escritura proibida,
e cada arrepio teu recita um salmo de carne vencida.

Entre teus seios, minha boca faz morada sagrada,
e desço como peregrino à flor, tua oferenda molhada.
Lambo-te devagar, como quem sorve uma revelação,
e tu tremes — mandona do mundo, agora súplica em vão.

Montada em mim, és tempestade, ritmo em maré violenta,
mas é minha mão que conduz teus quadris, lenta, sedenta.
Te viro — arqueada em oferenda, tua nuca reza por mais,
e te penetro como quem escreve num altar de desejos carnais.

Te possuo em versos, em pausas, em estalos e súplicas mudas,
em ti, o gozo é rito, e tu és profana e pura, inteira e desnuda.
Mandas no mundo, mas aqui... teu império me pertence,
pois sou teu domínio secreto — onde te calas e finalmente consentes.