Sezar Kosta

A COLHEITA DO TEMPO

No solo suspenso do instante,

brotam sementes invisíveis —

filhas do que já fomos,

mães do que ainda seremos —

bordando no silêncio

a promessa do que virá.

 

Em cada gesto pequeno —

o café que escorre pela borda,

a palavra que voa sem rumo,

um olhar que finca raízes —

o chão se abre, sensível,

como quem espera chuva.

 

Mas nem toda semente é luz:

há as que nascem entre ciscos,

plantadas por mãos cansadas

que esqueceram o tato do cuidado

e regam com silêncio seco

um campo que amarga cedo.

 

Ainda assim, é no miúdo do agora

que a colheita se desenha.

Semeamos com dedos atentos,

regamos com tempo e fé,

sabendo que o presente é terra viva,

onde o futuro aprende a crescer.

 

E entre o espinho e a flor,

entre a dor e a promessa,

descobrimos que a verdadeira colheita

não mora só no fruto aparente,

mas no que a terra nos devolve em segredo:

a coragem de recomeçar.