Victória Bianca

Absurdo

Mamãe me perguntou: o que eu quero da vida?

O que eu quero, mamãe?

 

Quero dedicar meu trabalho a fazer parecer.

Sem efetivamente ter sido.

Fazer parecer que...

Desde sempre 

a natureza soubesse o que eu sinto,

antes de mim.

 

Fazer parecer que sei dizer

coisas imensas com palavras minúsculas,

com a voz mansa...

 

Fazer parecer que me importo

em responder quaisquer questões sobre a vida,

mas ficar sempre na borda da resposta,

sem dar o nó na costura.

 

 

Fazer parecer que há algo bom em mim.

Nessa genealógica e respiratória falta.

Que acende, apaga.

Acende, apaga.

 

Quero ter minha própria liturgia.

E, se for possível,

meus próprios pecados.

 

Quero cunhar o verbo como quem sara.

Lapidar a boca como quem saliva.

Quero escrever salmos,

cânticos,

rezas,

cantigas.

 

Mamãe...

o que eu quero da vida?

 

Eu não sei

Como se diz o que se quer,

sem ,se, dizer?

 

Como nomear

todas essas coisas inúteis

que eu quero fazer?

 

Mamãe,

acho que quero criar um novo idioma!

Pra dizer alguma coisa...

Muito específica...

Que é sagrada e ao mesmo tempo profana

 

Quem sabe, inventar um Deus laico, que é ao mesmo tempo Deus e ao mesmo tempo vivo.

 

Eu não sei, mãe.

Eu não sei o que quero da vida.

Eu não sei oque que eu quero fazer.