Roberta G.

Passado.

Passado
 
Olá,
meu amado passado...
 
Sinto falta de você
como o vento sente das asas de um pássaro,
como sente um filho
a ausência de um pai que fugiu da responsabilidade.
 
Meu amado passado...
Seu cheiro,
seu calor,
sua ternura
vivem em mim.
 
Permanecem acesos no meu consciente,
como uma tarde quente de verão,
como um passeio no parque
num sábado qualquer,
cheio de risadas que já não ouço mais.
 
Me perco nas memórias
que você me deu,
nas pessoas que colocou no meu caminho,
nos sentimentos que hoje só existem...
aqui dentro.
 
Meu querido passado...
A você, eu devo tudo.
Se hoje sou quem sou,
é porque você me moldou.
Se estou onde estou,
é porque você me ensinou —
com amor,
com dor,
com quedas,
e também com abraços.
 
Obrigada...
Por me mostrar que o futuro não é um monstro,
que o presente é um professor —
às vezes cruel,
às vezes sábio —
e que você...
ah, você...
é aquela sombra leve que,
quando tudo pesa,
me oferece um segundo de paz.
 
Meu digníssimo passado...
Você me deu uma família.
Você me deu um lar.
Você me deu tudo,
e mais um pouco.
 
Se eu soubesse que, um dia,
você se tornaria aquilo
que eu mais gostaria de chamar de presente...
Eu teria te vivido com mais cuidado,
com mais respeito,
com mais amor,
com mais ternura,
com mais compaixão.
 
Meu belo passado...
Se você me visse hoje,
me reconheceria?
 
Teria vergonha de mim?
Ou se orgulharia?
 
O que pensaria
de alguém que vive contigo
vinte e quatro horas por dia?
 
Que encontra paz
nas nuvens do que foi,
e que sente falta da beleza
que você me mostrou,
e que o presente me roubou?
 
Eu disse,
um dia,
que o futuro não é ruim
e que o presente é um professor...
 
Mas me pergunto:
será que esse professor
se aposentou?
 
Será que aquilo que não era tão ruim,
hoje virou desprezo?
 
Será que ainda serei capaz
de te olhar com bons olhos?
De te amar
com a mesma força
com que te amo hoje?
 
Por favor...
não me deixe acreditar
que um dia vou deixar de te amar.
 
Não permita
que o futuro manche sua beleza.
Não permita
que o presente me convença
de que só te procuro
porque nunca te superei...
 
Como quem insiste em manter de pé
um casamento falido.
 
Oh, meu amado passado...
Mesmo com esses pensamentos horríveis,
mesmo temendo que, daqui a alguns anos,
eu passe a te odiar...
 
Já te peço perdão.
 
Porque talvez,
quando o futuro voltar a me ensinar,
e o presente deixar de ser pedra no meu caminho,
eu volte a sentir tudo isso de novo.
 
E, nesse dia,
eu te pedirei perdão —
de todo o meu coração.
 
Com todo amor que me resta.
E com todo ar
que eu ainda insisto em buscar...
 
Sua querida,
– Roberta.