Qual nau que singra em mar de esquecimento,
Sem porto certo ou rota a perscrutar,
Assim te ergo o verso, ó desconhecimento,
Que em densa névoa o ser vem a ocultar.
Não te procuro em mapas ou em lendas,
Nem vosso fado, ó sombra, quero ler;
Em vossa essência, as eras, tu as prendes,
E o tempo alheio ao que não quer saber.
Do vasto mar, que a bruma envolta cobre,
Não sai a voz, nem gesta a recordar,
Nenhum herói de ti jamais discorre.
Nenhum brasão se impõe no teu lugar,
És a certeza do que não se alcança,
A liberdade em não mais te buscar.
Nem glória em ti se nutre, nem esperança,
Somente o puro e límpido ignorar.
Que os feitos grandes de almas renomeadas,
Se gravitem no bronze, em voz que aclama;
Tuas passagens, silentes, ignoradas,
São a matéria que jamais inflama.
Não há lamento em tua deslembrança,
Nem ânsia de saber o que virá.
És a quietude em meio à bonança,
A paz de um \"tanto faz\", de um \"será\".
Que em vossas brumas, ó Ninguém sem nome,
Se encontre a calma de não mais querer.
Em ti, a mente que se não consome,
No fardo vil de tudo discernir,
Qual vastidão que o olho não abarca.
Ou a canção que o vento faz sumir,
Assim te deixo, ó essência que demarca,
O doce dom de apenas existir.
https://youtu.be/XgWz55phFKQ?si=4Ie_kpZ_aejaen2Z