Houve um tempo em que duvidei dos encantos,
quando os dias vinham nus, sem cor,
e a esperança se arrastava —
um véu esquecido, perdido no vento.
O mundo parecia exato demais,
sem espaço para o brilho das estrelas,
sem margem para o toque dos milagres —
apenas o silêncio frio do concreto.
Diziam que o amor era invenção,
perfume fugaz na luz do dia,
eco distante de histórias alheias,
um desejo que nunca se alcança.
Mas havia algo — sutil, invisível —
nas entrelinhas de um gesto,
no calor acidental de mãos que se tocam,
no olhar que demora, sem querer partir.
Um livro aberto na página certa,
um riso rompendo o tédio da rotina,
o som da chuva que canta na madrugada,
lembrando que a vida respira poesia.
Sussurros que não vêm do mundo,
mas do fundo — um rumor de sonho
teimando em viver,
mesmo sob a pele da descrença.
E foi quando menos esperei
que a centelha se fez clarão:
não vinda de fora,
mas um fogo íntimo, irrefreável.
O amor atravessou-me — flecha antiga,
com o peso exato do que é real.
Não explosão, mas alvorada,
lento incêndio de reconhecimento.
A vida mudou sua temperatura:
palavras ganharam asas,
olhos, fôlego,
coração, lar.
Aprendi:
a magia não é espetáculo,
é sutilidade —
coragem de ver o real
com olhos de encanto.
É escolha —
pacto silencioso entre sentir e permitir,
momento em que o medo se desarma
e o vibrar se abre em chama.
Há beleza em quem acredita,
mesmo após quedas,
em quem encontra no caos
a luz da constelação nova.
Hoje, não busco milagres fora —
sei que carrego o fósforo.
A centelha não vem do outro:
nasce
no instante exato
em que escolho não desistir.
Enquanto houver alguém
que sonhe de olhos abertos,
ame com os pés no chão
e a alma em combustão.
A magia — chama antiga, indomável —
há de viver,
em cada coração incandescente,
aguardando o sopro certo
para incendiar o mundo.