Às vezes, o mundo se revela nos detalhes que quase ninguém nota —
Dona Lúcia, mãos trêmulas, desafia a máquina do banco,
os dígitos piscando como enigmas de outro tempo.
Ela respira fundo, ajeita os óculos,
e em cada toque hesitante há uma coragem miúda
de quem aprendeu que o tempo não espera,
mas também não vence.
Ao lado, Diego finge mexer no celular.
Por dentro, uma tempestade:
perguntas sem respostas, sonhos costurados com medo.
Ele fecha os olhos, conta até dez,
e encontra forças num lugar secreto,
onde ninguém aplaude, nem vê.
Mais adiante, um homem se abaixa —
Joelhos no chão duro do asfalto,
dedos ágeis refazem o laço do tênis da filha,
e no nó paciente há o desejo
de que ela siga firme, mesmo quando tropeçar.
A mudança, você percebe, não é um trovão,
tampouco um clarão repentino.
É um fio de água cavando a pedra,
uma semente insistente,
o silêncio de passos que não desistem.
No compasso do cotidiano,
as pequenas revoluções acontecem —
anônimas, persistentes,
dentro de cada um que escolhe tentar de novo.
E talvez, só talvez,
seja nessas horas mudas
que o mundo realmente se transforma.