Isis P. Told

Os sonhos de um relógio

No fundo escuro do oceano,
um velho relógio, sem som, sem engano.
Parado no tempo, perdido no chão,
sem tique, sem taque, sem direção.

Sonhava em ser bravo, ser pirata no mar,
cruzar mil ventos, saber navegar.
Ver peixes dançando ao redor da embarcação,
sentir-se capitão, dono da imensidão.

Será que podia, quem sabe, dormir?
E em sonho profundo, por fim, existir?
Guiar um navio por ondas sem fim,
com olhos de estrela e alma de clarim.

Mas veio a verdade, cortante, cruel,
rajada que acorda, vento de fel.
Era só um relógio, quebrado, calado,
coberto de areia, cansado, enterrado.

E acima de tudo, passavam ligeiros,
os barcos reais, seus rumos certeiros.
Sem nunca notarem, sob a maré,
um sonho afogado que um dia foi fé.