Maria do Socorro Domingos

OSTENTAÇÃO

 

Certo dia, uma gralha
Que se achava inteligente
Passou e viu uns pavões,
Bonitos, e, de repente,
Pensou arranjar um meio
De se tornar diferente!

Ela ficou encantada
Com tão singular beleza:
As aves com lindas penas,
Encantos da natureza,
Pensou: - Se eu ficar igual,
Terei porte de nobreza!

Foi falar com os pavões
E a cada um pedia
Um pouco de suas penas
Para ver se conseguia
Ficar igualzinha a eles,
Era só o que queria!

Os pavões, muito educados,
Não quiseram confusão,
Emprestaram suas penas
Para a gralha que, então,
Vestiu-as e ficou tão bela,
Quase morreu de emoção!

Com os seus novos amigos,
Ela se pôs a passear,
Das outras de sua espécie
Começou a desdenhar,
Desprezo e indiferença
Era o que tinha para dar.

E o tempo foi passando,
E ela toda empolgada,
Pensando ser diferente,
Orgulhosa e deslumbrada,
Esqueceu a sua origem,
Não se lembrava de nada.

Mas os pavões descobriram
Da gralha, a pretensão,
E lhe pediram, de volta,
Todas as penas, então
A gralha ficou raivosa
E disse-lhes: - Entrego não!

- Sendo assim, ó dona gralha,
Nós vamos é arrancar!
E, com as penas, sua pele
Nós vamos também tirar.
Pelada e toda ferida
A senhora vai ficar!
 
E sem dó nem piedade,
Cumpriram a triste sentença,
A gralha, que na verdade
Já era pavão, por crença
Viu-se triste e depenada,
Sofrendo com a indiferença.

Pensou assim: - Vou voltar
Para os meus velhos amigos,
E a todos vou contar
O que aconteceu comigo.
Sei que não vão me negar
Alimento... E um bom abrigo

E as gralhas lhe receberam
Com amor e solidariedade
Mas, antes, à velha amiga,
Disseram grande verdade:
 \"Melhor ser feio e autêntico
Do que belo com falsidade\".

                   * * *

Cordel, de minha autoria,baseado  em \"A gralha e os pavões\" de  Esopo, fabulista grego do século VI A.C.

Maria do Socorro Domingos