Tainá Lopes

Escravi, dão

Chego novo, farda justa,

olho atento, mente assusta.

Piso leve, quase mudo,

mas aqui ninguém escuta tudo.

 

Dão tarefa, dão missão,

mas não dão mão.

Só cobram, só espreitam,

e se eu cair... eles aproveitam.

 

Alguns antigos — olho frio —

não ensinam, não estendem fio.

Vivem pra manter o lugar,

puxam tapete pra não precisar lutar.

 

Se escondem atrás da experiência,

mas praticam a concorrência.

Fingem ajudar, depois desviam,

esperam a falha e se saciam.

 

“Quer subir? Se vire só.”

Enquanto sorriem com desdém maior.

Aprendi rápido: não é só o patrão,

que aperta o nó na minha mão.

 

Têm os que já desistiram,

e os que, piores, se investiram

no papel de novo opressor,

esquecendo a própria dor.

 

E eu penso, nessa ilusão:

escravi, dão.

Com vírgula pra enganar,

como se ainda fosse pra sonhar.

 

Dão trampo, dão pressão,

dão mentira e punição.

Mas no fundo, só tiram:

tempo, alma e direção.

 

E os vilões? Alguns têm crachá antigo,

e orgulho de ver o perigo.

“Se eu sofri, você vai também.”

Essa é a lógica de quem já foi refém.