Isis P. Told

Uma fome insaciável

Estou com fome,  
fome de falar.  
Preciso dizer, preciso cuspir  
o que mastigo há tanto.  

\"Não podes. Cala-te.  
Engole.  
Dissolve tuas palavras  
nos dentes do silêncio.  
Alimenta-te de ti mesmo.  
Engula o que te sobra,  
ninguém deve ouvir.\"  

Mas não sacia.  
Não há sabor  
no banquete de ideias guardadas.  
É um festim amargo,  
que me faz mastigar a mim,  
repetindo-me inteiro.  

Preciso mais.  
Mais do mesmo vazio,  
como quem busca plenitude  
num prato sempre raso.  

Vai que, um dia, talvez,  
comendo o que penso,  
eu me veja  
menos submisso  
à fome de falar  
que, não importa o quanto cale,  
nunca me deixará.