eduardo cabette

O PIANISTA

         Diuturnamente

         sentava-se à frente

         do gigante envernizado

         de dentes ebúrneos

         pincelados de preto.

 

         Sentava-se

         e de seus dedos hábeis

         soltavam-se as mais belas

         melodias.

 

         Tocava com a alma,

         sentia prazerosamente a música dominá-lo

         e se perdia entre os ritmos,

         os sons.

 

         Às vezes era meia noite,

         Às vezes era meio dia,

         Às vezes estava acompanhado

         de amigos, de mulheres...

         Às vezes estava só.

 

         Mas sempre tocava

         e assim era feliz!

 

         Um dia o encontraram

         duro, gelado,

         com o rosto sobre as teclas.

 

         Os amigos choraram,

         As mulheres choraram,

         e mais alguém da vizinhança,

         do piano-bar,

         da boêmia,

         sentiu saudades daquela alma de artista.

 

         Na solidão da sala

         o piano calou-se;

         até que numa noite

         em que todos saíram,

         foram para os bares,

         uma noite em que as ruas sorriam

         depois da meia noite,

         ouviu-se uma música

         por toda a cidade

         enquanto os brancos dentes do piano

         movimentavam-se

         como num sorriso largo

         a um saudoso amigo.