Não quero mais…
mentir sobre mim.
Não quero mais me esconder…
atrás das palavras certas,
das roupas neutras,
do sorriso forçado.
Passei anos…
anos inteiros…
fingindo que não sentia,
que não via,
que não doía.
Mas agora…
agora que tudo em mim grita…
agora que a verdade escorre pelos meus olhos…
eu me aceito.
Não é descoberta.
Nunca foi.
Eu sempre soube.
Lá no fundo…
bem lá no fundo onde a luz quase não chega,
eu já sabia.
Mas…
não quis ver.
Fechei os olhos,
apertei o peito,
e fingi que não tinha nada ali.
Sempre senti…
mas me forcei a apagar o que sentia.
Fingi que era só confusão.
Fingi que era só uma fase.
Fingi…
Estava lá.
Sempre esteve.
Presente, latente, viva.
Mas eu ignorei.
Empurrei pro escuro.
Finja. Engula. Se esconda.
Foi o que me disseram…
foi o que aprendi.
Nunca me aceitei de verdade…
mas hoje, eu tento.
E todo dia,
com o peso do mundo nas costas,
eu acordo,
me olho no espelho
com olhos cansados
e me forço a vestir a armadura…
Pra ir ao colégio…
onde tudo é julgamento,
onde tudo é olhar torto,
onde tudo exige que eu seja outro…
e não eu.
Tenho que sustentar essa mentira.
Tenho que sustentar essa máscara.
Tenho que calar.
Tenho que engolir seco.
E a dor…
essa dor que não devia estar aqui…
me visita todos os dias.
E eu me pergunto…
com o coração apertado e os olhos baixos…
por que…
por que eu não nasci do jeito que eles chamam de \"normal\"?
Por que eu tenho que ser assim…
tão diferente…
tão fora do que esperam?
Sempre que eu minto pros outros…
minto pra mim.
É como morder a própria língua
pra agradar quem nunca me escutaria.
E essa verdade que escondo…
é como uma rosa.
Tão linda,
tão cheia de cor,
tão viva.
Mas toda beleza tem espinhos.
E eu já me perfurei tanto…
tanto…
que minhas mãos sangram
só pra sentir, por um instante,
o doce cheiro das rosas.
A beleza me custa dor.
A liberdade me rasga a pele.
Ser eu…
tem um preço.
Mas ao mesmo tempo…
existe uma beleza indescritível
na forma como eu me permito…
tentar ser feliz.
Mesmo que digam que é errado,
mesmo que apontem,
mesmo que me olhem como se eu fosse um erro,
é lindo.
É tão…
tão lindo.
Pra muitos, não.
Pra mim… é.
Pra mim… é tudo.
Infelizmente pra alguns.
Mas… felizmente pra mim.
Eu nasci assim.
E quer saber?
Foda-se.
Sim…
eu me atraio por homens.
Sim…
por mulheres também.
E qual o problema nisso?
Qual é o erro?
Onde está o pecado?
Porque, pra mim,
tá tudo certo.
Finalmente…
depois de tanto negar,
depois de tanto fugir,
eu me aceito.
Eu me entendo.
Mas…
ainda assim…
dói.
Dói demais ter que arrancar uma parte de mim
todos os dias…
como se fosse um pedaço sujo,
algo que precisa ser escondido,
apagado,
queimado.
Dói ter que mentir,
ter que encolher,
ter que fingir.
Todo…
santo…
dia.