joaquim cesario de mello

METAMORFOSE

 

Conheci meu menino na infância

Aquele corpo franzino

seu jeito dissimulado

de parecer bem-educado

os cabelos bem penteados

que por baixo escondiam

o gestar dos futuros pecados

e os olhos verdes claros

como claras são as alvoradas

ainda não usavam óculos

nem conheciam cemitérios

como o de Santo Amaro

que ficava por detrás do muro

que dava para a frente da casa

onde todos com ele moravam

 

De repente

o corpo cevou

o jeito mudou

os cabelos rarearam

deixando à mostra os pecados

os olhos anoiteceram

não havia mais muro

separando a casa

que de chofre vazia ficou

 

Não me dei conta dessa passagem

tão certa

tão previsível

tão definitiva

como toda a infância

que um dia

pra sempre

um dia se vai