Escrever é o gesto de dar corpo ao invisível,
de colher o vento que dança nas frestas da alma,
antes que ele se perca no abraço do ar.
Como uma tela sem tinta,
onde o som se faz sombra,
e a palavra, frágil, se transforma em luz.
Na madrugada serena,
quando o universo sussurra seus segredos,
escrevemos sobre o que não se vê,
mas se sente — como um perfume fugaz
que se esconde nas dobras do tempo.
Cada palavra é um abraço ao vazio,
tentando tornar eterno o efêmero,
num breve instante.
Quem escreve não sabe a quem fala.
O papel é altar silencioso,
onde depositamos a voz
para que ela se dissolva no vento
e alcance algum lugar distante,
onde, talvez, alguém, com olhos atentos,
descubra o que o silêncio tentou esconder.
Nos pequenos gestos do cotidiano,
nas coisas que o olhar não alcança,
a poesia se revela.
Como o brilho suave de um farol perdido,
na curva solitária da estrada,
ou o eco de uma palavra sussurrada
que se dissolve na paisagem da vida.
E, quando o último suspiro da escrita se apaga,
não restam explicações,
apenas o ressoar do que não sabemos,
mas que, ao ser dito,
tocou o fundo do ser.
E é nessa entrega, no gesto de deixar partir,
que o silêncio finalmente encontra sua voz.
No fim, quem escreve não busca compreensão.
Busca, talvez, deixar que a saudade se faça,
que o vento traga consigo a lembrança
de algo que não se pode tocar,
mas que, de algum modo, se sente —
como o perfume de um sonho
que se esvai ao amanhecer.