Fui primavera quando cheguei ao mundo — a natureza explodia em cores e aromas, um jardim de descobertas a cada novo olhar. Mesmo nos dias de pranto, o coração pulsava com a promessa de um recomeço. O ar estava impregnado com o perfume de infinitas possibilidades, e a vida se abria para mim como uma rosa que desabrocha aos primeiros raios de sol ao amanhecer, despertando-me para um novo dia. Eu era uma criança, pequena diante de um mundo vasto e desafiador, mas a curiosidade me guiava como uma bússola certeira. Cresci como um ipê jovem e vigoroso, com os galhos estendidos ao vento, desafiando tempestades e lançando-se em direção aos sonhos.
Então veio o verão. O fogo da juventude ardeu forte, como uma chama impaciente que desconhece o medo, iluminando caminhos amplos, sem fronteiras, onde cada escolha era um convite ao desconhecido. Corri atrás das minhas certezas incertas, como quem persegue uma estrela cadente, sem notar que a pressa também era um labirinto. Perdi-me tantas vezes quanto me encontrei, acreditando que o calor jamais dissiparia, sem perceber que até os dias de sol mais intenso terminam em horizontes tingidos por sombras crescentes, rendendo-se ao abraço inevitável da noite.
O outono chegou sem aviso, trazendo consigo a delicada arte da incerteza. Vi folhas caírem, vi pessoas partirem e chorei por aquilo que não pude reter. Os dias perderam um pouco de cor e calor, e aprendi que tudo o que cresce, um dia, se desprende, levado pelo tempo. Mas o vento da esperança, embora por vezes frio, não veio apenas para levar — ele dançou entre os galhos vazios, sussurrando que soltar também é um ato de amor. Espalhou sementes pelo chão, desenhou novos caminhos no desconhecido e me lembrou que algumas histórias se encerram antes que possamos escrevê-las por completo. E está tudo certo — porque cada despedida, por mais dolorosa, traz em si a promessa de um novo começo, aqui ou em outro tempo e lugar.
Agora sou inverno. Os dias são mais silenciosos, como se o mundo tivesse baixado o tom para que eu pudesse escutar a mim mesmo. O tempo parece se apressar, mas descobri que sou eu que preciso desacelerar para me observar. Há um frio que antes me assustava, pois eu o confundia com ausência e vazio. Hoje, entendo que o inverno não é o fim, é um intervalo necessário. O solo, à primeira vista estéril, esconde segredos sob sua superfície gelada — nele dormem sementes, resguardadas pelo silêncio, à espera da estação certa para despertar. O céu de inverno, límpido e estrelado, me lembra que a solidão não precisa ser desamparo — ela pode ser um abrigo, uma companheira discreta que ensina a beleza da pausa, do recolhimento. O inverno se tornou meu aliado, não o algoz que pensei enfrentar.
Sem elas, essas fases, talvez eu nunca tivesse chegado a esse processo contínuo de amadurecimento e passasse uma existência inteira sem notar que a vida não é uma linha reta, e os ciclos não se vão para sempre. Cada mudança foi um espelho, no qual precisei me enxergar para compreender a mim mesmo. Ainda há primavera nos meus recomeços, verão nas minhas paixões, outono nas minhas despedidas e inverno na minha espera. Dentro de mim, os ciclos continuam — e eu sigo, aprendendo a dançar com elas, as quatro estações que vivem em mim.
Pedro Trajano