lipinho

Cadaleito

Sim. Sim. Sim.
Não. Eu não.
Não acredito que se morre
quando se morre.
Eu nasci quando morri.

Anos, reduzidos a
uma caixa de madeira.
Dor. Sangro. Rasgo-me.
Ali me vejo. Curei.
Não fui curado.

Morri.
Eu morri?
Acho que não.
Quem morre é quem fica.
Eu não fiquei. Mas morri
quando outros morreram.
Me dói.

Amanhã já não acordo mais.
Frio. Escuro. Úmido.
Minha caixa tem míseros metros.
Madeira e ferro. Esse sou eu.
Resumo-me a ferro e madeira.

Ontem eu vivi. Hoje morri.
Amanhã, não estarei aqui.
Estranheza.
Dor.
Dor? Lembraram de mim?
Fui percebido?

Acho que deixei de só perceber.
Fui percebido.
Causei dor. Não gostaria,
mas nada pude fazer.
Morri.

Minhas vestes, que farão?
Não me importo. Não as uso mais.
E meus bens? Que me importa?
Meu corpo? Tocaram.
Morri.

E a dor?
Bem, ela me importa.
Ela fica.
Vago. Aonde vou?
Não sei.
Acho bonito.