Lua em Libra

#1 - Entre o Abismo e a Espada - Captulo 1: A Caida

Naquela noite, tudo parecia conspirar para que a energia entre nós se tornasse algo palpável, quase tão densa quanto o ar que respirávamos. Desde o instante em que nossos olhares se cruzaram pela primeira vez, senti algo que nunca havia experimentado antes. Uma sensação arrebatadora tomou conta de mim — um calafrio no coração, misturado com uma quentura inexplicável, como se o universo houvesse sussurrado ao meu íntimo: “Você a conhece, mesmo sem nunca tê-la visto antes.”

 

Ela era linda de um jeito peculiar, e seu olhar carregava um brilho que era ao mesmo tempo doce e provocante. Nos conhecemos no dia anterior, e desde então passamos horas conversando. Descobrimos afinidades, compartilhamos histórias e criamos um laço imediato que tornou tudo natural quando, naquela noite, ela me convidou para ir ao apartamento dela. Foi lá que decidi realizar o tratamento profundo.

 

Durante o processo, senti suas energias fluir por entre minhas mãos, e, em certos momentos, era como se nossos corpos estivessem em completa sincronia. Sua respiração profunda parecia me atrair para dentro de sua alma, como se cada expiração carregasse fragmentos de suas emoções mais íntimas, criando um laço invisível e indissolúvel entre nós. Eu sabia que havia algo maior acontecendo ali, algo que transcendia o plano físico. Ao final, algo em nossa dinâmica mudou. Ficamos mais descontraídos, e nossos toques, antes tímidos, se tornaram mais íntimos — embora não cruzassem o limite do sexual. Havia um fogo latente, prestes a se acender.

 

Ao término do tratamento, ela abriu os olhos, ainda relaxada. Mas no fundo de seu olhar, algo mudou — um brilho intenso, quase como um chamado. Eu fui direto:

 

— Você sentiu isso? — perguntei, enquanto ainda mantinha minha mão sobre a dela, firme, mas calorosa.

Ela hesitou por um instante, mas depois sorriu timidamente, desviando o olhar.

— Talvez... — sua voz era suave, mas carregava um tom de provocação.

— Talvez? — repeti, inclinando-me um pouco mais perto dela. — Não é algo que se sente todos os dias. Algo assim... é único.

 

Seu rosto corou ligeiramente, mas seus olhos, ah, seus olhos entregavam tudo. Eles me encaravam com uma intensidade que beirava o desafio, ao mesmo tempo em que seus lábios entreabertos sugeriam entrega.

 

Sem pensar muito, puxei-a para perto, nossos corpos colidiram em um calor que parecia vir de dentro. Meus lábios encontraram os dela, e o mundo ao nosso redor desapareceu. A paixão nos consumiu, cada toque, cada carícia aumentando o desejo que nos ligava de maneira irrevogável.

 

Nosso momento juntos foi intenso, como se cada toque fosse uma conversa silenciosa entre nossas almas. Minhas mãos percorriam seu corpo, explorando cada curva com reverência, enquanto ela cedia à minha dominação com um misto de timidez e entrega que apenas fortalecia nossa conexão. Havia fogo em seus movimentos, mas também uma doçura que tornava tudo ainda mais hipnotizante.

 

A cada instante, sentia que algo maior nos unia — algo que transcendia o físico. Talvez fosse o destino, essa força invisível que nos guia sem que percebamos. Era como se, de alguma forma, nossas vidas tivessem sido orquestradas para convergir naquele momento, naquela cama, com nossos corpos em chamas e nossas almas entrelaçadas. Enquanto eu mergulhava mais fundo na intensidade daquele instante, não pude deixar de refletir: e se tudo que havíamos vivido antes fosse apenas preparação para esse encontro? E se, naquele quarto, estivéssemos desvendando o propósito oculto de nossas existências?

 

Depois, ela adormeceu em meus braços, como se estivesse em paz pela primeira vez em muito tempo. Sua respiração suave e compassada criava uma melodia silenciosa que parecia sincronizar-se com os batimentos do meu coração. Eu a observava, encantado com a serenidade que dominava seus traços, enquanto sentia o calor de seu corpo ainda colado ao meu.

 

Por um instante, me permiti refletir sobre como o destino havia nos levado àquele momento, como se cada escolha, cada evento em nossas vidas tivesse nos conduzido para esse encontro quase sobrenatural. Era um pensamento avassalador, mas também profundamente confortante.

 

Eu, por outro lado, sentia meu corpo fervilhar. A energia que compartilhamos havia me deixado em um estado de excitação e exaustão simultâneas. Afaguei seus cabelos com cuidado para não acordá-la, e então decidi ir ao banheiro para me refrescar.

 

A água morna escorria pelo meu corpo enquanto tentava organizar meus pensamentos. Algo me incomodava — um pressentimento estranho que não consegui ignorar. Saí do chuveiro e decidi vasculhar cada canto do apartamento para garantir que nada nem ninguém pudesse ameaçá-la. Olhei em cada quarto, verifiquei portas e janelas, certificando-me de que tudo estava trancado e seguro. Apenas quando tive certeza de que ela estava protegida, voltei ao banheiro. Foi então que vi. Um vulto passou rapidamente pelo espelho, algo que arrepiou minha espinha. Secando-me apressadamente, voltei ao quarto, em estado de alerta.

 

Enquanto eu me aproximava da cama, o horror se revelou. Uma mão grotesca, demoníaca, com dedos longos e deformados, cobertos de escamas escuras e brilhantes, surgia de um buraco no chão. Era como se a própria escuridão houvesse ganhado forma. Ao redor do buraco, centenas de insetos rastejavam freneticamente, emitindo um som que misturava zumbidos e estalos.

 

A mão agarrou o tornozelo dela com uma força brutal, puxando-a para baixo. Ela permanecia em um sono profundo, como se estivesse presa em um transe, enquanto suas unhas afiadas penetravam na carne como garras de ferro. Meu coração disparou, mas a coragem me dominou. Havia apenas um pensamento em minha mente: eu a protegeria a qualquer custo. Com um grito de determinação, ignorei o medo que ameaçava paralisar-me e avancei. Não havia tempo para hesitar, apenas agir. A adrenalina tomou conta do meu corpo, me empurrando a lutar contra o impossível.

— Não! — gritei, correndo em direção a ela. Segurei seus braços com toda a minha força, mas o buraco parecia exercer uma sucção poderosa. A mão demoníaca não recuava.

 

Então me  joguei no chão, agarrando seu braço com todas as minhas forças enquanto meu coração batia selvagemente. \"Preciso salvar ela\", pensei desesperadamente. O buraco parecia querer engolir o mundo e cama já estava sendo engolida. \"Não vou deixar isso acontecer!\", dizia a mim mesmo enquanto tentava desesperadamente puxá-la.

 

Senti o suor escorrendo pela testa, minhas mãos começando a escorregar. \"Mais força\", ordenei ao meu corpo já exausto. \"Ela depende de mim. Vamos, não posso falhar agora.\" Com um último grito de determinação, finquei mais ainda os pés no chão, puxando com tudo o que tinha. \"Ela não vai ser levada, não enquanto eu puder lutar!\"

 

Vendo que não existiria outra saída, sem pensar duas vezes, me joguei no buraco junto com ela. A sensação foi instantânea: o ar desapareceu, substituído por uma atmosfera pesada, fétida, com um cheiro que misturava enxofre e carne podre. O gosto amargo invadiu minha boca, enquanto uma pressão surda preenchia meus ouvidos.

 

Quando finalmente paramos de cair, senti um sutil alivio e o conforto da agua, porem ao emergimos percebi que estávamos em um lago grotesco, onde a água tinha uma tonalidade acinzentada e esverdeada, espessa e turva, exalando um odor podre, semelhante a esgoto estagnado. A superfície borbulhava de forma irregular, como se algo dentro estivesse tentando escapar.

 

Os bancos do lago eram formados por ossos e detritos, uma mistura macabra de restos corroídos e detritos enegrecidos. Por entre as margens, limos com aspecto doentio e grudento de cor avermelhada, com formato aterrorizante, se agarravam às rochas, pulsando lentamente como se estivessem vivos.

 

Criaturas deformadas, apenas sombras disformes, nadavam de forma errática abaixo da superfície, emitindo guinchos perturbadores que quebravam o silêncio sufocante. Um vapor ácido subia da água, queimando levemente a pele exposta, enquanto um eco distante de lamentos reverberava no ar, como se o próprio lago chorasse de sofrimento. O ambiente era uma pintura de desespero e horror, apresei para tirar a minha amada dali.

 

Ela ainda dormia em meus braços, alheia ao caos que nos cercava. Eu sabia que precisava protegê-la, mas também sabia que não estávamos sozinhos ali. Algo ou alguém nos observava. Cada fibra do meu ser gritava para que eu lutasse, para que encontrasse uma maneira de sairmos dali.

 

E assim, o verdadeiro pesadelo começava.