Celebração
Nasceu! nasceu!
Outro gauche na vida.
Outro torto, outro pouco.
Desceu no mundo.
Que mundo, Carlos!
Que vasto mundo.
Mundo muito para poucos.
Para muitos, mundo pouco.
E sobe ladeira, e desce ladeira.
Lhe dói as costas, a cabeça, os ombros.
Mas faz amigos, aperta as mãos.
Vive, existe, existe, não vive.
Outro torto, outro do seu povo.
Franzino, calado, covarde.
Questiona, teima, aceita.
E ama, ah! Como ama.
Ama do jeito que sabe amar,
De um amor pouco, amor intenso, amor finito.
De um sorriso pouco,
De olhar sem jeito, de um canto desafinado.
Desafiado pega ônibus, se mistura, como se atreve?
És torto, mas o mundo, que mundo!
O mundo é lindo, mudinho de merda.
Pintado, ajeitado, se veste, levanta, pega fila, trabalha.
O homem com o café na mão espera,
A mulher espera, a criança espera,
o país inteiro espera.
Outro torto, com os olhos deitados no jornal,
Com os olhos irritados, com o peito roubado,
(ela tem um sorriso que vale a pena estar no mundo)
Espera os sábados, pede uma cerveja,
Uma dose do seu uísque preferido,
Tira a poeira da garganta, em silêncio,
De um silêncio que grita, que faz no mesmo peito roubado um lar.
Eita tempo, eita mundo,
Outra vez estou aqui.
Agora velho, cheio de lembranças.
Relaxado, esquecido em devaneios.
Meus devaneios tolos, enrugados,
Todos em preto e branco.
Nasci em uma manhã de sábado,
E chovia.
Leonardo Ramos