Charles Araújo

SAUDADE QUE ME DEVORA 

 

SAUDADE QUE ME DEVORA 

 

Saudade é uma chama silenciosa,  

Que arde sem alarde nas profundezas do meu ser,  

Ela se inflama nas madrugadas mais escuras,  

Quando o mundo repousa, e só eu estou desperto,  

Sentindo o calor que não me abraça,  

E o vazio que se espalha ao meu redor.  

Não é apenas ausência, é presença diluída no tempo,  

Um ressoar das horas vividas, que insiste em retornar,  

Cada minuto que passa é uma nota dissonante,  

Tocando a melodia de um amor que ainda ecoa.

 

É o tremor dos meus lábios ao recordar  

O contorno das trilhas daquele corpo que me levava ao delírio,  

E o gosto dos lábios dela ao encontro dos meus,  

Onde cada beijo era uma explosão de sentimentos,  

Um encontro de almas em meio ao caos da existência.  

Era ali, nos braços daquela que mais amei,  

Que o caos do universo se dissolvia,  

E o tempo, em sua pressa de escapar,  

Fazia uma breve pausa, permitindo-nos existir,  

Como se fôssemos imunes à finitude,  

Como se a eternidade estivesse ao nosso alcance.

 

Ah, como é estranho, essa saudade!  

Ela não apenas dói, ela persiste,  

Como o tato da pele que ainda carrega  

As marcas dos dedos que um dia a percorreram,  

Cada toque era uma promessa não dita,  

Um caminho que levava à perdição e ao êxtase.  

É a lembrança viva de mãos que desenhavam  

Caminhos de fogo em meu corpo,  

Deixando rastros que o tempo não consegue apagar,  

Rastros que o coração se recusa a esquecer.

 

Cada toque era um convite a viver a eternidade,  

Sem medo de que um dia teria fim,  

Hoje, ainda é como se o desejo estivesse aqui,  

Sussurrando no silêncio do quarto vazio,  

O eco daquela doce voz que me acalmava,  

Transformando a solidão em um espectro de companheirismo.  

Nas noites sem fim, a saudade pesa mais,  

Quando o céu chora suas lágrimas frias em forma de chuvas,  

Sinto em meu rosto o mesmo desamparo,  

Lágrimas que deslizam, tímidas,  

Contando uma história de um coração partido,  

De uma alma que se perdeu  

Nas esquinas de um destino que nos separou.

 

Sim, um homem também chora,  

E é nesse choro que encontro a coragem  

De admitir a profundidade do amor que vivi,  

Porque na fragilidade dessas lágrimas,  

Sinto uma força que a dor revela,  

Pois até o sofrimento tem sua beleza,  

Quando é fruto de um amor tão intenso,  

Que transcende a própria dor,  

E nos eleva a uma nova forma de ser.

 

A saudade tem gosto agridoce,  

É a amargura da ausência misturada  

À doçura dos lábios que um dia beijei,  

Lábios que prometeram amor eterno,  

Mesmo sabendo que o tempo é implacável.  

Agora, as lembranças vêm como tempestades,  

Trazendo ondas de um amor que insiste em voltar,  

Um furacão de memórias que me abraça e me tortura,  

Me afoga em emoções contraditórias,  

Que alternam entre o calor do desejo  

E o frio da ausência.

 

Como posso esquecer?  

Como posso apagar os vestígios  

Do amor mais puro que já senti?  

Essas lembranças são como estrelas,  

Que brilham mesmo depois de mortas,  

Iluminando o céu de minhas noites mais escuras,  

Guiando-me em meio à escuridão,  

Como um farol distante que me lembra  

Que o amor, mesmo ausente, ainda vive em mim.

 

Há algo de paradoxal na saudade,  

Ela machuca, mas também conforta,  

Ela me prende, mas me liberta,  

Me sufoca, mas me permite respirar.  

Nas noites solitárias, sou prisioneiro e cúmplice  

Das minhas próprias lembranças,  

E quando fecho os olhos,  

Vejo o que a maldade do tempo levou,  

Seu riso leve, sua presença ao meu lado,  

Momentos que o presente não me devolve,  

Mas que a memória, teimosa, preserva.

 

O tempo, com suas mãos impiedosas,  

Tentou roubar sua presença de mim,  

Mas ele não sabe que o amor não é feito de horas,  

É feito de eternidades condensadas,  

De segundos que se tornam imortais  

Quando tocados pela chama do afeto verdadeiro.  

Sim, a saudade é um oceano vasto,  

No qual navego sem rumo certo,  

Procurando por um porto que talvez nunca encontre,  

Pois era ela, sempre foi ela,  

O meu norte, o meu abrigo, a minha casa,  

A mulher que verdadeiramente amei.

 

O que fazer com essas memórias?  

Elas não são apenas lembranças,  

São faróis que guiam meu coração  

No meio da tempestade,  

São o reflexo de um amor que se recusa a morrer,  

Que insiste em viver em cada canto do meu ser.  

Mesmo distante, ainda sinto o calor  

Do toque em minha pele,  

E cada suspiro que dou  

Parece trazer de volta um pedaço dela,  

Como se, no ar que respiro,  

Houvera um traço do amor que compartilhamos.

 

As horas arrastam-se, pesadas,  

E eu, com o coração partido,  

Aprendo que viver é, em parte,  

Saber lidar com a dor.  

E Chorando eu descubro, não uma fraqueza,  

Mas uma forma de honrar o que foi vivido,  

Pois cada lágrima que cai não é apenas dor,  

É o tributo que ofereço ao amor que um dia me preencheu,  

Que me moldou, que me ensinou  

O que é amar de verdade,  

O que é ser vulnerável e forte ao mesmo tempo.

 

A saudade, essa amante eterna,  

É minha companheira nas horas escuras,  

Ela me guia por caminhos que, à primeira vista,  

Parecem tortuosos e áridos,  

Mas que, no fundo,  

São trilhas que me levam de volta ao centro do meu ser,  

Onde o amor nunca morre,  

Onde as lembranças não se apagam,  

E onde a luz daquele afeto persiste,  

Mesmo na ausência,  

Mesmo no silêncio.

 

Saudade, paradoxal e bela,  

É o fardo que carrego com gratidão.  

Pois na dor de sua presença,  

Descubro que o amor é uma chama eterna,  

Que ilumina mesmo a noite mais escura,  

E, enquanto o vento sopra,  

Tentando apagar essa luz,  

Eu a mantenho acesa,  

Em cada suspiro,  

Em cada lágrima,  

Em cada lembrança que o tempo não ousa levar,  

Pois é na sauda

de que encontro a prova  

De que o amor, uma vez vivido,  

Nunca se extingue,  

Ele apenas se transforma  

Em um eterno crepúsculo no horizonte do meu ser.

C.Araujo