Letícia Alves

Qualquer coisa especial desabrochou no meu íntimo inconsciente

Nos momentos fraternos parece desaparecer qualquer coisa...
Não sei muito bem o quê e isso me deixa feliz – a inconsciência é
uma dádiva. Respiro. Repito. Remo pensamentos. Resigno-me.
Uma densidão comum e exuberante é refinada no processo e
conflui em forma de resposta-oposta. Assim nascem bonsais
de fraternidade, leves, cálidos e graciosos.

Qualquer coisa que é efêmera tem seu tempo para desabrochar
muito certo. Não me agrada muito o específico, mas tenho, com
o tempo, compreendido melhor o ritmo-caminho. O ritmo da
música que me é natural transpus para a vida – qualquer coisa
fez sentido. A palidez do que o olho vê é insubstituível; o azul da
melodia consome e é consumido; ensina, come, mata e ensina.

Não há mais coisas há fazer nos momentos de \"qualquer coisa\"
especiais – o inefável é que diz, é como nada, é simples assim.
O relógio me lembra de finalizar esse dia; recuso-me insolentemente,
mas com o coração de quem sabe qual é a resposta-oposta e o
ritmo-caminho natural dessas coisas. Sei no consciente, mas o que
mais importa é o inconsciente no fundo d\'alma, atrás do pensamento...

A magia da palavra – até mesmo dessa que é demasiado limitada
para definir momentos onde qualquer coisa efêmera e luminosa
escapa de forma ludibriosa – consegue contagiar a alma, fico cheia
delas, mas quando qualquer coisa especial acontece, sinto-me sendo
retirada delas. Voam e somem. Como se nunca houvessem existido.
Conheço-as, mas o meu inconsciente íntimo ignora-as; é um faz-de-
conta sublime. Aprecio o que vejo sem relógios humanos por perto.

Como se o tempo parasse, minha alma sente-se tão acordada que
meu corpo dorme. Paro lentamente. O pensamento voa como uma
ave sobre o mar, engulo todos os desejos e estou. Essa incapacidade
de capturar esse magnífico quadro, essa vontade de o fazê-lo e essa
minha memória curta, estão todos despejados no inefável do meu
coração. Apesar dessa incapacidade, sou grata pela capacidade
divina de olhar como quem nunca chorou, a vida que desabrochou.