Quero uma tarde como aquela
minha mãe debruçada na janela
vendo o dia andar frente a ela
como se as horas fossem aquarelas
As roseiras vermelhas do jardim
oscilando como barcos no mar
sopradas pelo vento que vem
do cais do porto próximo da casa
e minha mãe envergada na tarde
observando o tempo pela janela
passando devagar por ela
Quero uma tarde como aquela
a carrocinha do vendedor ambulante
vinda sabe-se lá de onde
com sabonetes e brilhantinas
talcos, pentes e perfumes
de porta em porta transitando
e minha mãe olhando o mundo pela janela
Quero uma tarde como aquela
eu remexendo o húmus da terra
procurando o ouro escondido das botijas
e com meus dedos encardidos de infância
brincando com o estica e enrosca das minhocas
Quero uma tarde como aquela
minha mãe na janela
as rosas do jardim
o mascate passando
eu me sujando de terra
e o dia se pondo
levando a tarde
e o menino dentro dela