joaquim cesario de mello

UMA TARDE COMO AQUELA

 

Quero uma tarde como aquela

minha mãe debruçada na janela

vendo o dia andar frente a ela

como se as horas fossem aquarelas

 

As roseiras vermelhas do jardim

oscilando como barcos no mar

sopradas pelo vento que vem

do cais do porto próximo da casa

e minha mãe envergada na tarde

observando o tempo pela janela

passando devagar por ela

 

Quero uma tarde como aquela

a carrocinha do vendedor ambulante

vinda sabe-se lá de onde

com sabonetes e brilhantinas

talcos, pentes e perfumes

de porta em porta transitando

e minha mãe olhando o mundo pela janela

 

Quero uma tarde como aquela

eu remexendo o húmus da terra

procurando o ouro escondido das botijas

e com meus dedos encardidos de infância

brincando com o estica e enrosca das minhocas

 

Quero uma tarde como aquela

minha mãe na janela

as rosas do jardim

o mascate passando

eu me sujando de terra

e o dia se pondo

levando a tarde

e o menino dentro dela