O abismo olhou de volta
Uma, duas, três,
sabe-se lá quantas vezes...
Do outro lado da pista de dança, os olhos de esfinge da deusa negra
convidavam-me a mergulhar de cabeça nos mistérios de sua provocante minissaia
e a desvendar o segredo guardado entre as pernas daquela divindade andrógina
Só Deus sabe como eu queria me jogar com tudo nos braços da tentação
Mas eu estava petrificado
Nem mesmo toda a cachaça ingerida foi suficiente para afogar a minha insegurança
Um conflito silencioso se travava dentro de mim
Meu corpo tornara-se o campo de batalha de uma espécie de guerra civil
entre coração e cérebro
O primeiro, de natureza selvagem e faminto por emoções arrebatadoras,
ansiava pelo êxtase ardente ao deliciar-se com aquele pedaço de mau caminho de gênero ambíguo
O segundo, apegado a crenças paranoicas e limitantes de criação própria,
alertava-me, por meio de uma chuva de pensamentos intrusivos, sobre a condenação
imposta aos que se deixam levar por impulsos animalescos
Sem saber o que fazer no meio do fogo cruzado,
desperdicei a chance de provar do fruto proibido
e fui o único a sair perdendo nesse trágico confronto