Maria do Socorro Domingos

DISCURSO ELEITOREIRO

Ontem à noite eu dormi

E sonhei que perto de mim,

Um político mentiroso

Num comício bem ruim,

De uma forma descarada

Com a voz emocionada,

Ele discursava assim:

 

\" Meu senhor, minha senhora

Vote em mim nesta eleição,

Sou um sujeito decente

Sou um pacato cidadão,

Eu sou firme e verdadeiro

Vou passar o tempo inteiro,

Trabalhando pra nação.

 

Se eu for eleito prefeito

Nesta terra de valor,

Faço até o impossível

Pelo pobre eleitor,

Dou casa, cama, comida,

Carro, dinheiro e bebida,

Seja lá o que diabo for.

 

Vou calçar todas as ruas

Fazer praças e jardins,

E mandar vir lá do céu

Quarenta e um querubins,

Pra ficar distribuindo

De cara boa, sorrindo,

Uns pacotes de alfenins.

 

Vou fazer uma avenida

Com pedras de diamante,

Para você passear

Alegre e muito elegante,

Para assim admirar

A beleza de um lugar,

De brilho estonteante.

 

Água pura e cristalina

Vai jorrar por todo lado,

Você não paga mais nada

Porque tudo vai ser dado,

Se você algo comprou

E a conta não pagou,

Também será perdoado.

 

Ônibus passando na porta

Toda hora e todo instante,

Eu estou até pensando

Em transporte itinerante,

Você chama, ele vem,

Penso que isto também

Vai ser muito interessante.

 

Eu vou distribuir queijo

Tapioca e rapadura,

Farinha, milho, feijão,

Toda a sorte de mistura,

Quero ver povo sorrindo

Alguém estará mentindo

Se disser que a vida é dura.

 

Escolas funcionando

Todo dia e toda hora,

Crianças alimentadas

Daqui ninguém vai embora,

Uma cidade bem linda

O que não foi feito ainda,

Juro! Vou fazer agora!

 

Vou construir muitas casas

Para a população

De preferência, na garagem,

Vou colocar um carrão

Você não compra mais nada

Tem uma vida abastada,

Diga lá - é bom ou não?

 

 

Saúde, não se preocupe,

Vai melhorar com certeza

Os médicos, de rua em rua,

Sorridentes e com presteza,

Você dizendo o que sente

Num instante, de presente,

Vem a cura! Que beleza!

 

A questão da segurança

Eu vou resolver também,

Não lhe roubarão mais nada

Pode mostrar o que tem,

Polícia pra todo lado

Você ficará guardado

Tudo calmo! Tudo bem!

 

E agora, neste momento,

Meu abraço derradeiro,

Vou findando meu discurso

E digo, meu companheiro,

Eu não sou amigo urso

Se você não tem recurso

Arranjo-lhe algum dinheiro.\"

 

 

Acordei, registrei tudo,

E fui dormir novamente

Logo voltei a sonhar,

Que pesadelo insistente!

Era a posse do prefeito

E ele todo satisfeito,

Dizia pra sua gente:

 

\"Graças a Deus, fui eleito

Nesta me dei muito bem,

Distribuí dentaduras

Roupas, sapatos também,

Eu digo, sinceramente,

Sou um cara competente

E não devo nada a ninguém.

 

E agora, caro eleitor,

Eu vou lhe presentear

Com um tapete voador,

Para você viajar

Enfatiotado, num terno,

Para os quintos do inferno

E nunca mais me procurar!\"

 

(Maria do Socorro Domingos)