Em uma região muito remota da costa do Mar Demiju, às margens de um riacho nascido de águas cristalinas, vivia uma comunidade de hábitos eminentemente silvestres, que só se alimentava de folhas de abricó-de-macaco, vegetal que abundava naquela região, durante todas as estações dos seus pequenos anos de 150 dias. Com a fartura de folhas e a água incessante do riacho, eram autossuficientes, mas também eram pequenos e ignorantes, e nasciam e morriam aos montes. Por conta de sua organização social, eles mantinham aquela comunidade há cerca de duzentos anos. Acomodavam-se em cinco grandes cabanas, organizados como clã do Abal; clã do Abel; clã do Abil; clã do Abol e clã do Abu-abu, o mais forte. Cada clã possuía centenas de indivíduos, igualmente divididos entre serezinhos em idade de se alimentar de folhas mastigadas; em idade de mastigar e engolir folhar; em idade de mastigar folhas, cuspir a metade e engolir a outra parte; e em idade de morrer. No seu leito tosco, sob cada pequena cama com estrado de cana fístula, havia um grande penico de acaiacá. Durante a noite, cada aldeão lotava seu enorme penico com uma urina de verde muito intenso, da qual emanava uma fumaça extremamente densa. Assim que soavam as primeiras gongadas matinais, eles saiam em fila, cada um com seu penico, e os despejavam logo após a primeira queda que fazia o riacho depois da nascente, que dali corria verde por cerca de dois mil metros, até alcançar o mar. Então eles voltavam, ingeriam as primeiras folhas do dia, e subiam, como se num culto, a montanha vizinha mais próxima, para ver se o Mar Demiju já havia ficado verde. Vê-lo nessa cor era o grande objetivo centenário daquele povo. Conta-se que foram exterminados por uma Pandemia, que invadiu o seu planeta, que tinha o formato de disco, mas até mesmo o último deles – membro do clã Abu-abu – ainda acreditava no poder da urina verde de seu grande penico de acaiacá.
-- esse conto foi publicado em meu blog pessoal (https://antoniobocadelama.blogspot.com/) em 14/06/24 --