Vinicios Cesário

Quanto tempo temos ?

E se eu soubesse o tempo que me resta

O que eu faria?

Tentaria uma nova fé e me converteria

e nela  me lançaria com tanta força

tal qual aquele, que quase afogado

avista um tronco que boia na água

e faz dele  sua salvação. 

 

Ou, zangado com os deuses e indignado com a vida

 perdendo qualquer fé, esperança ou razão

 xingaria e amaldiçoaria   tudo e  a todos

 pensando em como seria eu arrancado 

 de Gaia antes do tempo.

 

Ou, diante da triste notícia e 

invadido por uma sublime e doce  impotência 

as  lágrimas da dor sentida 

ao molharem   meus olhos

seriam agora  um colírio

que me faria  enxergar   tudo e a todos

de forma  e   formato diferente 

 

então…

 

No bandido veria

… a infância perdida.

No homem violento

… um ser inseguro. 

No rico soberbo

… um mendigo de afeto. 

No político corrupto 

… um analfabeto da ética. 

No capitalismo selvagem

… o menino guloso que come sozinho os doces  até a barriguinha doer

mas não consegue doar,  o que  ele não consegue comer.

No  horror das guerras

... um muro de ódio construído com os tijolos da ambição. 

Nas rugas do ancião 

… as linhas tortuosas de um caderno que se chama vida. 



Enfim, em mim enxergaria 

… uma ínfima e quase invisível partícula do universo 

que um dia teve corpo e nome

viveu, chorou e sorriu

como todos os mortais 

e agora continua o incrível e maravilhoso mistério da vida

em outro e indefinido lugar

talvez em outro tempo

quem sabe com mais entendimento

enxergando melhor por fim

sem precisar do colírio das lágrimas.