Doloroso

O passeio de trinta anos (Um ano de Saturno)

Oh, ask the dust

(...)

Ooh, she moves in silence

(...)

Sweet salvation, baby

Melts my heart made of stone

Please guide me and carry me on

(...)

(Ian Robert Astbury / William Duffy / William Henry Duffy)

 

A noite, as estrelas caindo, a chuva brilhando num céu extinto…

Dilúvio de amarguras,

Sonhos fundidos escorrendo, se perdendo

Nas sarjetas do universo…

Avalanche de tempo que nada soterra,

Mas sepulta a vida cheia de vida

Não querendo mais a vida. 

A noite. As trevas…

Que sentimento é esse?

Que fome, que ânsia, que loucura, que desespero é esse

Que abala todo o vazio que se traz por dentro? 

Que aflição é essa que faz desejar a combustão instantânea 

Do corpo e da alma!?...

A alma... 

Poço sem fundo, depósito de toda amargura, 

Alçada à condição de privilegiado instrumento 

Vedor de Deus... 

Eterna chama de sentir a vida

Em todas as suas desgraças 

E desavenças…

Labirintos…portas coincidentes…

Encruzilhadas que não se cruzam;

Invisibilidade…

Um remanescente soldado em marcha cansativa,

Persegue incansavelmente uma ilusão, 

Buscando prolongar uma inexistente alegria,

Uma alegoria do que seja viver.

Labirintos…portas coincidentes…

Encruzilhadas que não se cruzam;

Invisibilidade…

Alinhamento de astros de dois universos conflitantes…

Adiante, diante de olhos artificiais

Que não deveriam mais ver,

Mas que enxergam os artifícios dos planos irreais,

A realidade precisa e sutil se apresenta vestida de preto

E muito bem se distingue do breu noturno.

Sua epiderme sintética circunda o que se conhece por desejo,

E cintila sempar no vácuo que torna todo o entorno insignificante,

Materializando um ser espectral esculpido em perversidade e amor.

Seu avanço é como uma lâmina rasgando a densidade da escuridão e da vontade. 

Os cabelos, fervorosamente negros, balançam ritmados pela evolução;

Um corpo que se agita na aurora da vida.

Ambos não são dados a pertencer…

Nada consegue deter ou desviar;

Nem mesmo o bêbado errante

Que tenta acertar a trajetória de um bólido rumo a aniquilar o desconhecido. 

Assim como o evento celeste, 

O alinhamento terreno se desfaz, 

E o brilho, o amor, o sonho, a vertigem,

A ilusão desaparece em sua órbita intangível,

Enquanto a solidão vagueia errante e imperceptível 

Numa rota mal traçada da existência,

Dobrando a esquina para desaparecer na névoa do que está para sempre perdido…

Tantas manifestações sem vida vagueiam a esmo

E faz com que a morte se sinta em casa.

Estão confundidas diante de tanta desesperança, 

Imperceptíveis perante o anestésico da dor de existir…

Perdido encontrei a luz que não me ilumina;

Vagando achei meu caminho

Povoado por serpentes mortas e fantasmas vivos.

Dúvidas que não se dissipam, 

Medos já domados,

Desilusões pavimentando a estrada.

A tristeza toma a forma de tudo o que existe…