Letícia Alves

É preciso pairar com o ordinário

Na brisa gentil do tédio pairo sem tentar parar.
É inconsciente e natural.
Pessoas que passam entre o meu eu visível:
um embuste perfeito e o meu eu material...

Que tipo de pessoa eu sou? 
Nos olhos alheios qual o reflexo que formulo?
São os reflexos que recebo a resposta?

[Eu estou bem? Por que continuo tão séria?]

A necessidade de avaliar tudo minuciosamente
rouba a graça da existência. Acabar é o que falta.
Falta acabar com os detalhes que não prometem nada.
Deixar que o ordinário seja extraordinário, e que o que
falta seja motivo para perseverar, enquanto o que já
é seja razão para agradecer e caminhar o caminho. 

As pessoas que cercam essa zona também
sabem que o tempo é templo?
No meu coração fogos de artifício explodem.
Tudo que está explodindo é macio.
Devastador, mas macio.

O tipo de pessoa que sou
não é pessoa, é rio: pois assim
como é difícil guardar um rio
que corre dentro de nós,
é difícil guardar-me totalmente,
sem espectros ou nuances.

No meu mundo pequeno há uma
imensidão que escusa palavras.
Nesse lugar contempla-se o verde
sem pensamentos. Basta olhar e
aceitar o que se é, o que é puro-verde,
o que morre e floresce cada manhã.

A minha raiz exige o
ordinário e mira no especial. 
Essa mesma raiz tem me pedido
muito, mas tudo o que é preciso
para alimentá-la é água e luz solar.
Tudo que é necessário é o ordinário.