O que é que vou fazer
com esse dia espatifado
com essas horas quebradas
com esses minutos lacerados
e com esse amontoado de segundos
que ficaram trinchados no chão das datas
de um calendário que a vida de mim usurpou?
O que é que vou fazer
com aquelas noites em claro
com o silêncio do cômodo fechado
com a insônia dos sonhos não sonhados
e com todos os fantasmas fora dos armários
que flanados perambulam ao redor de mim deitado
sobre uma cama desforrada em que a vida me colocou?
O que é que vou fazer
com esses manuscritos acumulados
com esse tanto de versos abandonados
com a orfandade dos poemas não publicados
e com a dor que trago nos espaços vagos das costelas
que suspira vozes em forma de retratos feito de palavras
enquanto estou sozinho e a esposa assistindo televisão no quarto?