joaquim cesario de mello

AS PAPOULAS VERMELHAS DO JARDIM DA CASA

 

Quero de volta

as papoulas vermelhas do jardim da minha casa

 

Quero de volta

os supositórios que minha mãe aplicava

a canja de galinha com ovos cozidos picados

o cheiro de Vick Vaporub nas madrugadas

e o sabor meloso do xarope de Melagrião que tomava

 

Quero de volta

as brincadeiras criadas

com pneus velhos e latinhas usadas

os joelhos ralados das peladas

que curava na ardência dos Merthiolates

e os jogos de tabuleiro que não encontro mais

 

Quero de volta

o tic tac dos relógios de corda

o nascer do sol que nunca contemplava

o cheiro das pipocas douradas

amanteigadas e salgadas

que os pipoqueiros vendiam

frente aos cinemas na porta da entrada

 

Quero de volta

o bicho-papão

a comadre fulorzinha

o saci-pererê e a mula sem cabeça

que tanto me assustavam

e o boi da cara preta que minha babá

pra me fazer dormir sempre cantava

 

Quero de volta

aqueles tempos em que o tempo não passava

a meninice que nunca ali terminava

em meio as papoulas vermelhas

do jardim da minha casa

que hoje habita e respira

embaixo do asfalto da rua alargada

em que minha infância ficou enterrada