Gustavo Cunha

Alma agreste

Desta vida agreste,
 
Que de tão seca é caatinga,
 
O corpo lânguido se dilacera
 
Debaixo deste sol que aporrinha.
 
A impiedade da lâmina reluzente
 
Reflete o gosto acre de sangue viscoso.
 
Somos todos desertos de nós mesmos
 
Neste vasto sertão que padece de um sono de morto, de fome nordeste e de sonhos de vida um pouco a cada dia.
 
E assim, o sol do meio-dia, amargo, se faz paisagem
 
E açoita o solo inerte, onde se semeia o que é míngua.
 
Nesta vida assolada pelo clima, nada vinga ou é alegria.
 
Somos todos uma multiplicidade amalgamada de solidões
 
Em busca de folhagens mais copiosas num mundo distante.
 
A luz solar penetra ainda mais fundo a pele fustigada pelo tempo voraz,
 
E quer adentrar violentamente as pálpebras esfaldadas,
 
Como quem rompe uma porta, desesperado, a pontapés.