joaquim cesario de mello

UMA CARTA MATURADA DE TEMPO

 

Estou a te escrever esta carta

como se estivesse em meados do século passado

 

Uso papel em branco timbrado

desenhado com letras azuis pintadas

com a caneta tinteiro que um dia foi do meu pai

 

Desculpe-me a caligrafia ligeira e truncada

pois a redijo com o afobado agitado da alma

 

Quero mais uma vez te dizer que te amo

um amor assim tão veterano calmo e sereno

sazonado pelas formalinas de que é feita o tempo

 

De todas as cartas que jamais escrevi

esta é a bem inusual e a mais diferente

já que nela inscrevo os afetos que hoje tenho

com a juventude que dela não me segrego ou desprendo

 

Vou selá-la com o lambear embriagado da língua

feito estivesse a te beijar a boca por dentro

como assim foi que fizemos quando te pedi em casamento

 

Cartas de amor não seriam cartas de amor

se não houvessem nelas o respingar pigmentado

amadurado e prolongado do momento