Estou a te escrever esta carta
como se estivesse em meados do século passado
Uso papel em branco timbrado
desenhado com letras azuis pintadas
com a caneta tinteiro que um dia foi do meu pai
Desculpe-me a caligrafia ligeira e truncada
pois a redijo com o afobado agitado da alma
Quero mais uma vez te dizer que te amo
um amor assim tão veterano calmo e sereno
sazonado pelas formalinas de que é feita o tempo
De todas as cartas que jamais escrevi
esta é a bem inusual e a mais diferente
já que nela inscrevo os afetos que hoje tenho
com a juventude que dela não me segrego ou desprendo
Vou selá-la com o lambear embriagado da língua
feito estivesse a te beijar a boca por dentro
como assim foi que fizemos quando te pedi em casamento
Cartas de amor não seriam cartas de amor
se não houvessem nelas o respingar pigmentado
amadurado e prolongado do momento